Na noite imediatamente a seguir à da mudança da hora, os moradores de uma zona periférica do bairro da Boa-Fé, contígua ao Centro de Negócios Transfronteiriço de Elvas, ficaram a saber que há situações em que uma guilhotina afiada cortas as mãos, e que todas as rédeas escapam.
Isso foi o que pensaram que estava a acontecer, até se darem conta de que nem sequer havia rédeas.
A constatação resultou de uma festa de arromba (tímpanos) que começou às oito da noite de domingo, 30 de Março, e se prolongou até altas horas da madrugada de dia 31. A celebração decorreu numa famosa moradia rodeada de muros à prova do que lá se passa, mas ineficazes em abafar ruídos festivaleiros. Ao que os vizinhos conseguiram apurar, no interior da fortaleza dezenas de convidados divertiam-se à grande num concerto privado. O evento, divulgado no seio de uma comunidade habituada a casamentos de três dias, fartura de comida e música a acompanhar, tinha sido anunciado através de um cartaz-convite que revelava os nomes de uma dúzia de artistas famosos que farão furor junto daquele público, e que fazem de mim uma assumida iletrada na matéria. O cartaz exibia a foto do organizador e exortava à comparência numa ramboia musical inesquecível, cheia de alegria e bebidas à descrição. E como as pessoas em causa são de palavra de honra e cumprem com o que prometem, assim foi, com os devidos efeitos secundários de tão exagerado contentamento a acertarem em cheio na vizinhança, às reviravoltas na cama, a atafulhar os ouvidos com algodões, num crescendo de cansaço e desespero a verem o dia de trabalho aproximar-se.
Com o canal da paciência a comunicar com o da irritação, os lesados telefonaram à PSP, a pedir auxílio. Em resposta, após identificada a localização, os agentes informaram que os acontecimentos se encontravam fora da jurisdição da Polícia, e que estavam na dependência da GNR. Ato contínuo, o pedido seguiu na direção da Guarda Nacional Republicana que não sabem se foi ao local.
Na manhã seguinte, depois de uma noite mal dormida, e para alguns passada em claro, a indignação acompanhava o cansaço dos moradores. A desconfiar que a repetir-se o incidente, as autoridades poderiam fazem cumprir a Lei do Ruído, que no essencial proíbe: “atividades ruidosas temporárias perto de edifícios de habitação, aos sábados, domingos e feriados, e nos dias úteis entre as 20h e as 8h; atividades ruidosas temporárias perto de escolas, durante o horário de funcionamento e atividades ruidosas temporárias perto de hospitais ou estabelecimentos similares”, foram à procura de saber como agir. Ficaram a saber, que no máximo dos máximos, as autoridades deverão ir ao local para, com bons modos, alertar os prevaricadores para a ilicitude. Apanhados de surpresa, talvez a pensar que estão a chegar mais convidados, os infratores deverão abrir a porta, ouvir e prometer que vão baixar o volume ao Chitãozinho & Xororó que estiver a atuar naquele momento. Mal a autoridade virar costas, é expectável que voltem a subir os decibéis. Novamente chamada ao local pelos vizinhos desesperados, quando a força de segurança voltar a bater à porta, é provável que do interior ninguém responda, restando a hipóteses de a situação ser reportada por escrito e ser aplicada uma coima que vai aos 500 euros. Tratando-se de pessoas de posses e com pouco interesse, ou nenhum, em ter contacto presencial com as forças policiais, o valor será pago. E o assunto arquivado até ao próximo festival.
Na essência é isto que deverá acontecer a cada Rock in Lelo, Rom Alive, e por aí fora. Azar de quem estiver no sitio errado à hora errada, e que no limite do desespero, sempre pode cumprir com o clássico: “quem está mal, mude-se”.
E é isto!
