Esqueci-me de tudo e não me lembro de nada. Mas também não o quero.
Há no Alentejo uma calma que impera e uma força visceral de nos fazer desligar. Pelo menos assim o é para quem vem da cidade. E esta força, visceral repito, é tão imponente por não se revelar apenas no silêncio vasto das planícies ou no calor do sol que parece suspender o tempo. É muito mais: é uma alma que pulsa devagar, é um sopro antigo que corre entre as ramas das árvores, é uma pausa que se torna paz e saúde num mundo que não sabe o que é e teima em não saber para onde vai.
Passei uma semana em teletrabalho no Alentejo e voltei a constatar que este lugar é mais do que uma moldura de paisagens planas e cheiros genuínos. É um compasso diferente, uma melodia que questiona a pressa das cidades, um convite a desacelerar e a questionar o mito de que o trabalho é apenas uma presença constante e um barulho incessante.
Parece paradoxal juntar o futuro digital com a serenidade antiga, com o silêncio e com um tempo que se estica com as sombras das oliveiras ao fim do dia. Felizmente, esta harmonia tem vindo a florescer: há empresas que confiam e que oferecem liberdade às suas pessoas, deixando que sejam produtivas no seu ritmo e no seu espaço.
Urge a todos, aos do campo e aos da cidade, impedir que a corrida e o poder urbano não invadam o nosso chão firme, que não façam ecoar alto o ruído que ameaça abafar a nossa essência.
Nesta dualidade campo/cidade encontro uma verdade antiga: o valor do que entregamos não se define em horas sentadas, mas na qualidade das nossas mãos e dos pensamentos. E também nisto, o Alentejo é mestre. Tudo aqui existe com intenção, com alma e com sentido.
Despeço-me desta reflexão com dois convites a quem me lê:
– Para quem está no campo: fiquem, preservem, não deixem que o ruído vos encontre, aproveitem a lentidão que é um luxo raro, sintam a vossa essência e não se esqueçam que o vosso modo de viver é a semente do futuro.
– Para quem está na cidade: conheçam o silêncio, conheçam a vida para lá do trânsito, para lá do relógio, para lá da obrigação de parecer ocupado e não se esqueçam que o vosso caminho não precisa de pressa, precisa de verdade.
Seja ao ritmo da calma ou com o pulso da cidade, vivam com lentidão, com consciência e com honestidade. Porque viver com frenética e distância é a nova forma de estar ausente.
