São Pedro foi um dos doze apóstolos de Jesus Cristo, segundo o Novo Testamento e, mais especificamente, os quatro Evangelhos. Os católicos consideram Pedro como o primeiro Bispo de Roma, sendo por isso o primeiro Papa da Igreja Católica.
O Dia de São Pedro comemora-se em Portugal a 29 de Junho. Tal como São João e Santo António, São Pedro é um santo popular. Este dia é também conhecido como o dia de São Pedro e São Paulo.
OS FESTEJOS na Descrição de Motta e Moura (meados do séc. XIX)
(…) Os pastores e creadores d ́esta villa elegeram S. Pedro seu Patrono e lhe fazem anualmente uma festa
no mez de setembro, que é a maior e principal, que aqui se faz: consta de duas partes, e de ambas
participa o glorioso santo: a primeira, que é a religiosa, começa por vésperas solemnes, a que assiste toda
a corporação adornada com as suas melhores galas, e no dia seguinte, que é sempre um domingo, missa
de pontifical, e às vezes musica e sermão, a que concorrem os festeiros e seus famílias de um e outro
sexo; a segunda consiste em lauto banquete e jogos, cantares e folias, e bebidas, que se distribuem a
todos, que concorrem, e sobretudo na chacota, que é a maior solemnidade do festim.
Ordena-se o préstito pelas três horas da tarde da véspera em casa da festeira, d ́onde se sae: vem
precedido por um tambor, que bate a marcha, e um pifano ou gaita de folles, que o acompanha, seguem-se seis formozas donzellas vestidas no melhor gostos e elegância que podem, com pequenas bandeiras
encarnadas, e no centro a festeira com o estandarte, e depois uma ala parallela de zagaes com suas casacas e calções, e meias brancas e fivellas de grandeza patriarchal, que serviram já nos casamentos e baptisados de sete gerações, que as vão protegendo de qualquer avaria; e atraz d ́elles seis pastoras e duas respeitáveis matronas, com suas saias de chamalote, e roupinhas de grandes abas à polka e pandeiros de metal e soalhas, levantam as cantigas em honra do santo, que o coro todo, composto de muitas raparigas da terra, em harmonia e suavidade repete, acompanhado por duas violas, que menestréis da villa vão tangendo: fecha o cortejo outra ala de jovens pastores, que as vão guardando e defendendo de qualquer aperto na grande concorrência, que as acompanha, e vae seguindo; e depois de assim ordenado dirige-se à egreja do Prinicipe dos Apóstolos, quaes outrora os pastores do Tibre ao templo de Pan em Roma, onde canta muitas loas e cantigas, que antiga tradição transmitiu, e ninguém ousa alterar: toca-se o sino, levantam-se vivas, é victoriado S. Pedro, e no meio do maior alvoroço e alegria, recolhe tudo à villa cantando e folgando, e assim se dirigem à Matriz a cantar e festejar tambem o Santíssimo Sacramento, a quem dirigem muitas orações e cantigas; e d ́ali a casa da primeira auctoridade administrativa, a quem cantando imploram a precisa licença para correr a villa; e alcançada, o favor torn-se geral, porque todos e todas são agraciada com alguma cantiga, ou versinho em seu louvor; à porta dos pastores é victoriado sempre o pendão do santo, e à das madrinhas descança o cortejo, recebendo alguns refrescos, que lhe estão preparados; e assim em perfeito folguedo e satisfação se pass o resto do dia, até que pelas dez horas da noite chega ao logar d ́onde viera; e então o divertimento varia: um lindo fogo d ́artificio arde no meio dos applausos e enthusiasmo d ́um numerosíssimo concurso, que depois se converte em completo prazer com os repetidos doces, bebidas e tremoços, que os festeiros lhe mandam servir na rua mesmo, onde estão: ha muitos bailes, jogos e divertimentos, que se prolongam até que no dia seguinte o luminoso filho de Latona fendendo os ares em sua carroça dourada, lembra aos concorrentes de que é tempo de volver às penas e trabalhos, de que a vida é cheia, e que por algumas hors tinham esquecido.
N ́este dia repete-se a funcção em casa dos novos festeiros, que recebem a bandeira, e depois a victoriam
e conduzem em verdadeira ovação por toda a villa, e depois o mesmo préstito, e cantigas e folgares, e
banquetes da véspera, e às vezes com maior apparato e grandeza, conforme os brios e haveres de quem
dispende: e é uma festa, em que todos tomam parte e que interessa a todos: e são tão raras estas occasiões de prazer e folguedo geral na vida, e principalmente na vida que se vive em Niza, que não podemos deixar de fazer sinceros votos ao céo para que a conserve em toda a sua pureza e ostentação, com que tem passado por tantas gerações, que a tem gosado, e nol-a transmitiram.
in “Memória histórica da Notável Vila de Niza” – José Diniz da Graça Motta e Moura



NISA: A devoção a S. Pedro – patrono de pastores e creadores (II)
A capella de S. Pedro, em Nisa, descrita por Motta e Moura (1)
(…) Ha nos subúrbios da villa a capella de S. Pedro, que fica próxima dos muros na parte occidental, com
a porta voltada para este lado, como a maior parte das egrejas edificadas no seculo X; é hoje a maior, e
mais aceada das capellas particulares, porque está toda forrada, ladrilhada e rebocada de novo, e a capella mor pintada com muita arte e primor: tanto a porta de entrada como o arco da capella mor são de cantaria da terra, e de forma gothica, o que está revelando a sua antiguidade; o altar mor tem seu retábolo dourado, no meio do qual está o príncipe dos apóstolos com as vestes e insígnias pontificaes: do lado do evangelho tem uma sacristia para uso do clero e da irmandade, que n ́ella celebra as suas reuniões e adjuntos; e um púlpito de cantaria com escada por fora, e do lado da epistola uma pequena porta, e um campanário com uma sineta para annunciar a celebração dos officios divinos. No seu principio era pequena e estreita, de sorte que nos dias de grandes funções pouco mais do que o clero lá cabia, e crescendo a irmandade viam-se então em seus apertos, o que deu logar a alargar-se a casa e fazer-se no anno de 1638, do tamanho que tem hoje; e depois de feita começaram logos os fieis a dotal-a com rendimentos, para poder subsistir.
António Dias Brochado legou-lhe uma grande courella no termo d ́Arêz, com a condição de lhe dizerem
todos os annos por alma uma missa rezada; e depois deixaram-lhe mais um grande chão em frente da
porta principal da egreja e quando havia melhores esperanças de que a devoção continuasse, vieram as
leis de desamortisação, que lhe pozeram termo: é notável esta capella pela insigne irmandade, que n ́ella
se instituiu, e a administra e governa.
O clero de Niza fez um compromisso e estatutos, e não se achando estes já conformes às luzes das
necessidades do tempo, nomeou no anno de 1718 uma commissão composta do abbade Sebastião do rego da Silveira, dos bacharéis em cânones fr. João Dias Conde, e o padre Miguel Ferreira Franco, e outros para os rever e reformar, como na verdade reformaram fazendo aquelles, pelos quaes agora se governa, com tanta sabedoria, que mereceu grandes louvores do bispo D. Álvaro Pires de Noronha e Castro este compromisso, que elle confirmou em provisão de 31 de Janeiro de 1749: tinha então a irmandade vinte e dois clérigos. Além dos sacerdotes podem também pertencer-lhes seculares, e teem-lhe pertencido muitas pessoas distinctas, mas infelizmente na actualidade apenas conta um septuagenário; talvez pela taxa de entrada, que muitos querem e não podem pagar, e que por certo muito convinha abolir, ou pelo menos reduzir.
Tem um guião de seda branca, um esquife ou féretro particular para os seus irmãos, e usa de campainha,
quando sae em comunidade: a sua principal festa é no dia 29 de Junho, e faz três officios solemnes por
alma de cada irmão, que fallece, além de outro no oitavario dos Santos por todos, e pelos bemfeitores; e
os que lhe sobrevivem teem rigorosa obrigação de lhe mandar dizer três missas cada um, e rezar duas
vezes o Rosário de Nossa Senhora, d ́onde se vê que grandes são os benefícios espirituaes, que se colhem
d ́esta instituição.
(1) – Memória histórica da Notável Vila de Niza – José Diniz da Graça Motta e Moura

- S. Pedro na toponímia do concelho de Nisa
Nos textos anteriores salientámos a importância da veneração a S. Pedro, padroeiro dos pastores, no
concelho de Nisa, particularmente, as festas que em sua honra eram feitas em Nisa e Montalvão.
Celebrações semelhantes ocorriam também em Tolosa, Amieira do Tejo e Alpalhão, terras que tinham capelas dedicadas ao chamado “Príncipe dos Apóstolos”.
Em Amieira, muito antes de ser “do Tejo”, existiu uma capela erigida em sua honra e as festas deste santo popular eram bastante concorridas e com um cerimonial próprio.
Em Tolosa, terra de queijos, de rebanhos e pastores, há uma rua (e uma travessa) com o nome de S. Pedro, o que atesta a admiração popular por este santo.
Podemos perguntar-nos de onde vem o nome do Monte de S. Pedro, entre Chão da Velha e Falagueira, um dos vários povoados do concelho de que apenas resta a memória e um amontoado de pedras, como poderemos questionar a origem de algumas famílias de sobrenome São Pedro, comuns nas freguesias de S. Matias e de Santana.
Montalvão, mantém o nome do “santo popular” numa das ruas que converge para a capela do mesmo e, em tempos muito recuados eram populares as “Cavalhadas”, tradições que o tempo foi corroendo e de que hoje resta a fugaz lembrança.
Em Alpalhão, perduram as fogueiras e a festa religiosa realizada na capela devotada a S. Pedro, situada na
rua com o mesmo nome, curiosamente, uma das mais importantes da vila.
Os alpalhoeiros ou alpalhoenses, muito ciosos das suas devoções e tradições não seguiram a “moda” de
Nisa em mudar o nome às ruas por “dá cá aquela palha”.
Em Nisa, no início dos anos 30, o nome da Rua de S. Pedro – paralela ao edifício da fundação Lopes
Tavares, que hoje alberga os principais serviços da Santa Casa da Misericórdia – foi substituído pela
designação de Rua Capitão Vaz Monteiro, por decisão (imposição) de um outro oficial do Exército,
tenente Falcão, que exercia as funções de presidente da Comissão Administrativa da Câmara de Nisa.
Os motivos da alteração toponímica, nunca contestada pelos nisenses, ainda menos em tempos de
Dictadura, prendem-se, tão só e apenas, com a troca de favores políticos.
Vaz Monteiro, então Governador Civil, terá conseguido arranjar algumas verbas para obras no concelho, a
sofrer, na altura uma grande crise de trabalho e em agradecimento, Falcão, mandou às malvas a história e
a memória dos nisenses e numa chapa de lata – que ainda hoje perdura – opôs-lhe o nome do oficial que o favorecera.

E, podemos acrescentar, não se ficou por aqui. Uma reportagem do jornal “O Século”, em 1932, por
ocasião da visita a Nisa, do Presidente da República, Óscar Carmona, foram “serviços” que o tenente
Falcão considerou relevantes, a ponto de mudar o nome da Rua das Adegas para Rua de “O Século”, num
concelho onde mais de oitenta por cento da população não sabia ler nem escrever.
O crime de lesa memória, histórica e afectiva, da Rua de S. Pedro é tão ou mais relevante por ser este um
topónimo muito antigo, numa rua que antes era Canto (Canto de S. Pedro) e na qual se situava a capela
em honra do detentor das “chaves do Céu”, demolida no final dos anos 60 para dar lugar ao Centro
Infantil ali existente e propriedade da Misericórdia local, tendo sido alienada para o efeito uma importante parcela do espaço de fruição pública.
Mas, isso, são outras histórias que, se tivermos oportunidade, traremos a público.
Mário Mendes
Legenda das fotos:
1 antiga capela de s. pedro -1
1antiga rua de s. pedro – nisa
alpalhão – rua de s. pedro
1 capela de s. Pedro – montalvão
capela de S.Pedro Alpalhão (1)