Jorge Pais confirma possibilidade de encerramento
Uma última carta lançada para cima da mesa irá ditar, definitivamente, a continuidade ou o encerramento do NERPOR. A direção da maior Associação Empresarial do Distrito de Portalegre está em negociações com o principal banco credor. Se a entidade bancária der resposta afirmativa, vai ser elaborado um plano de recuperação. Caso venha a ser “não”, as portas terão de fechar.
Em entrevista ao Linhas de Elvas Jorge Pais, diretor do NERPOR, confirmou quea Associação luta pela sobrevivência, agarrada a uma boia de salvação escorregadia. As palavras do diretor são pragmáticas, elucidativas e reveladoras de que está preparado para a quase inevitabilidade do fim de vida do NERPOR. Os órgãos diretivos estão em gestão. A informação mais recente, difundida tanto na página da Internet, como no Facebook e no Instagram, reporta-se a Setembro de 2024. E já nem é possível estabelecer contacto telefónico com a entidade, porque “de momento não é possível aceder ao número que marcou”, responde uma gravação automática quando se liga para lá.
Preparado para tudo, Jorge Pais enumerou a sequência de contrariedades que entortaram um caminho que parecia seguir em linha reta, e que desajudam a acreditar na “salvação”. A Pandemia foi a ponta do iceberg, ao desencadear uma série de dificuldades financeiras, com os bancos a gorarem expetativas negando prorrogações de prazos indispensáveis a uma necessária reorganização de tesouraria. Na busca de soluções, o NERPOR propôs à Câmara Municipal de Portalegre a venda de parte das instalações. Após um longo processo negocial, o município declinou. Com as eleições para os corpos gerentes à porta, Jorge Pais preparava a saída, estando acordado que Armando Varela, na altura vice-presidente, avançaria para a liderança, o que não veio a acontecer “devido ao trágico acidente que lhe roubou a vida”.
Por inerência de funções à frente da Comissão de Gestão, Jorge Pais falou-nos detalhadamente do que aconteceu, de fragmentos da história do NERPOR e da preocupação de salvar trabalho realizado durante décadas, preservando o acervo documental, e acima de tudo, pugnando pela defesa do tecido empresarial da região, algo que já está garantido devido à criação de uma espécie de herdeiro a quem foi dado o nome de “Conselho Empresarial do Alto Alentejo”.

Fontes a que o Linhas de Elvas teve acesso indicaram que está a ser preparado o encerramento do NERPOR. Confirma a veracidade da informação?
Ainda não está definitivamente decidido. A situação de facto está complicada, mas está-se a estudar a possibilidade, ou não, de haver um acordo com o banco que é o maior credor e, na sequência disso, organizar um PER , um Processo Especial de Revitalização. O futuro do NERPOR está dependente do resultado dessa situação.
Quais são as dificuldades que a Associação enfrenta e que ameaçam a sua sobrevivência?
Quando surgiu a pandemia havia uma série de financiamentos que estavam em curso para a realização de vários projetos, que evidentemente, ficaram sem possibilidade de se concretizar. Por sugestão do próprio banco foram adotadas as moratórias que, na altura, foram utilizadas como maneira de facilitar a vida de todas as entidades, empresas e associações que tinham esse tipo de processos em curso. Tudo isso foi agregado numa só operação, por sugestão também da própria instituição, e fez-se um plano de amortização. Entretanto avançámos com um pedido de prorrogação do prazo, em que esteve acordado só o pagamento de juros sem amortização. Pensava-se que estava decidido favoravelmente mas depois, de forma inesperada e em cima do acontecimento, fomos informados de que o banco não tinha aceite essa prorrogação e que havia a necessidade de começar a pagar tanto os juros como a amortização. A situação de tesouraria não o permitia, porque também coincidiu com o período de transição dos Quadros Comunitários de Apoio. À semelhança do que aconteceu no passado, verificou-se uma quebra do número de projetos e de ações em que estávamos envolvidos, e não havia um fluxo financeiro que permitisse haver tesouraria para assegurar os pagamentos.
Para dar resposta a essa situação fez-se uma tentativa de acordo com a Câmara Municipal de Portalegre, que nos pareceu a entidade apropriada e com aparente interesse nisso, para aquisição de parte das instalações do NERPOR, para efeitos de realização de feiras ou de outros eventos. Ao fim de bastante tempo em que essas conversações foram existindo, sempre com a esperança e a convicção de que a Câmara iria fazer essa aquisição, o que permitiria resolver toda esta situação financeira, acabou por entender não comprar, e ficámos sem essa solução com que contávamos e que iria permitir a solvabilidade de todo este processo e a continuação normal da atividade. Também coincidiu neste mesmo período a realização de eleições no NERPOR, que acabou por não ter apresentação de listas. Chegou a haver um acordo entre todos nós que previa a minha substituição pelo então vice- -presidente, o Dr. Armando Varela, que infelizmente, como é conhecido, precisamente poucos dias antes dessas eleições terem lugar, e de ser eleito o novo presidente, teve aquele acidente terrível que lhe roubou a vida e que também fez gorar esta solução que estava programada e que iria, com certeza, também permitir que houvesse toda outra continuidade de ação. Em função disso, decidimos que fosse constituída apenas uma Comissão de Gestão para ir acompanhando e mantendo uma atividade mínima.
Entretanto foi constituído, para uma futura transição do acervo documental e histórico da instituição, que tem várias décadas de atividade marcada pelo apoio ao desenvolvimento económico e empresarial da região, o Conselho Empresarial do Alto Alentejo. Se os associados e as empresas da região entenderem, e porque é também uma associação sem fim lucrativos, esta entidade está aberta à participação de pessoas singulares e coletivas, de empresas, que tenham como objetivo pugnar pelo desenvolvimento regional baseado no crescimento económico e na atividade empresarial. Se houver realmente da parte dos associados esse mesmo espírito e disponibilidade para participarem e se organizarem na prossecução desta finalidade, se o NERPOR se conseguir manter, será uma das entidades associadas neste Conselho Empresarial.
Este Conselho Empresarial será uma entidade supra NERPOR ou é a continuidade do NERPOR?
É uma entidade diferente, distinta, que tem outra personalidade jurídica e tem um âmbito idêntico, de índole distrital ou regional. Mas também é diferente do NERPOR. Terá outra gestão, outra possibilidade de desenvolvimento e iniciativas próprias. Não é estritamente para suceder ao NERPOR, é para no caso de o NERPOR fechar, haver uma entidade que receba todo o arquivo, a documentação histórica, correspondências, tomadas de posição, que durante 30 anos (ou mais) foram tomadas. Penso que será a entidade que irá representar e defender os interesses de toda a economia regional, e que potencialmente irá agregar todas as entidades associativas, ou não, do Alto Alentejo. Esta figura prevê que todas as Escolas, Institutos Politécnicos, até a próprias Câmaras, possam agregar- -se, assim como as pessoas singularmente, numa estrutura que fica montada, e que terá condições para defender os interesses económicos de toda a região, que pugne pelo desenvolvimento do Alto Alentejo nas suas várias vertentes, especialmente na empresarial e na económica.
Voltando ao NERPOR, quais são as consequências de um possível encerramento? O tecido empresarial vai ficar muito fragilizado se esta estrutura ruir?
Eu acho que é extremamente importante, à semelhança do que vemos em outras regiões do país, haver uma entidade associativa que agregue e defenda todos os interesses económicos da região. Penso que seria mais uma decapitação na representatividade, na força da própria região, o desaparecimento de uma entidade com estas características. Com certeza que até ao nível das próprias entidades oficiais se criará um vazio de colaboração e diálogo para agregação de diversas ações que normalmente são, e devem ser, desempenhadas por estas associações que têm o perfil e as características adequadas para exercer essas atividades, e a de serem os interlocutores naturais e próprios neste diálogo com as entidades oficiais, para solução de alguns problemas que surgem, de constrangimentos, para sugestões, para propostas de medidas a adotar e a tomar para o desenvolvimento da região. Continuamos a defender isso, a existência de fundos de investimento regional que sejam um mecanismo de promoção e apoio ao investimento e de crescimento do tecido empresarial. De varrer a chamada discriminação positiva, que se deveria traduzir em diversas matérias de ordem fiscal e de apoio aos incentivos para a criação de postos de trabalho. Que entidade regional deverá assumir este papel de alguma reivindicação de medidas de apoio à atividade económica, aos empresários, de solicitação da existência de mecanismos de acesso ao crédito, de viabilização das empresas? Se não houver uma entidade com estas características a região perde força. Como diz a máxima popular “a união faz a força”. É uma expressão de capacidade reivindicativa regional haver uma entidade que assuma sempre esta posição de análise económica e social, que faça as suas propostas, apresente as suas reivindicações e intervenha junto do poder político a nível autárquico e nacional. Espero que, como tem sido até agora, que continue a haver ligação à Associação Industrial Portuguesa e a toda uma série de organismos, até a nível transfronteiriço, laços com outras associações espanholas e até de outros países. Na minha opinião é indiscutível e necessário que a região deve ter um organismo com estas características e que cumpra com o papel que têm outras organizações similares do país..
Tudo isto que referiu sintetiza a atividade do NERPOR?
Sim, foi sempre essa a atividade do NERPOR desde o seu início. Mas há também que reconhecer que somos uma região com um tecido empresarial muito frágil e muito pequeno comparativamente com outras regiões. Demograficamente somos uma região muito pobre, envelhecida. E se não há empresas para fixar pessoas, também não há pessoas para fixar empresas. Essa realidade talvez até reforce a necessidade da existência de uma organização dessas, para procurar inverter esta situação, e conseguir que haja um reforço do tecido empresarial, e com isso inverter demograficamente este plano inclinado em que estamos há décadas, de diminuição e do envelhecimento sistemático e consecutivo da população. Na nossa região 99,9 por cento das empresas são micro empresas que vivem assoberbadas com as dificuldades do dia-a-dia, de pagar impostos, de pagar salários, de cobrar, de vender, e resta-lhes muito pouco tempo para os seus responsáveis terem também uma participação nesta vida associativa e nestas ações de interesse coletivo e individual.
Significa que as dificuldades em que mergulhou o NERPOR refletem todas as entropias que pendem sobre as empresas da região…
Sem dúvida. É difícil querer ter associações muito vigorosas quando o universo dos seus associados e as entidades que deveriam dar essa força é frágil, pequeno e sem muita disponibilidade para participar. Se noutras regiões com outra dimensão e outra força, situações semelhantes têm ocorrido, muito mais se compreende que aconteça numa região como a nossa.
Qual é o universo empresarial que está ligado ao NERPOR apoiando-se na atividade que desenvolve e nos serviços que disponibiliza?
Quando há umas décadas nos constituímos, começámos com nove empresas da região que eram na altura associadas da Associação Industrial Portuguesa. O impulso da criação do NERPOR e de outros organismos similares de outras regiões, partiu da AIP. Inicialmente fomentou a criação de umas delegações regionais que depois evoluíram para associações autónomas e independentes, como é o nosso caso. Então no Alto Alentejo arrancámos no final dos anos oitenta com esse núcleo de nove empresas, também associadas na AIP. Isso significa que desde a primeira hora as empresas de maior significado e porte na região ficaram sempre associadas e depois foram aderindo outras organizações que correspondem ao perfil médio que descrevi há pouco, e que predomina na região, de micro e pequenas empresas. Estamos neste momento com duzentas e tal empresas associadas que se ligaram devido às ações de diversa ordem que o NERPOR desenvolvia de formação, de missões empresariais, apoio à internacionalização… entenderam também aderir. Serão essas agora que mais sentirão com certeza a falta de uma entidade que as possa apoiar.
Em que momento começou a ser evidente que o NERPOR estava a entrar num túnel com dificuldades
difíceis de ultrapassar?
Esta situação vem-se arrastando desde há um ano, um ano e tal. Foi ainda acompanhado pelo Dr. Armando Varela que, como expliquei, estava pré indigitado para ser o meu sucessor. Participámos numa reunião com ele, com a Câmara Municipal de Portalegre e com a instituição financeira junto da qual se pretendia resolver esta situação através da compra pelo município. Já nessa altura tínhamos a perceção das dificuldades e procurávamos encontrar soluções. Entretanto foi-se arrastando, mantendo esta expectativa de que se poderia resolver, mas afinal acabou, ao fim de vários meses, por se perceber que não seria possível. Começámos a partir dessa altura a ter que ir abandonando a atividade.
Onde está sediado o Conselho Empresarial do Alto Alentejo e o que acontecerá às instalações do NERPOR se a Associação vier a encerrar?
As instalações do NERPOR são constituídas por cinco frações. A Associação está constituída em propriedade horizontal e tem frações autónomas. A solução de venda à Câmara, e agora o que está a ser objeto de discussão e análise com o banco, é a resolução de todo o passivo pela dação em pagamento de três frações das cinco existentes, que correspondem à parte onde se realizam eventos. A fração onde funcionam ou funcionavam os escritórios, estaria fora deste âmbito e, a encontrar-se esta solução, é onde seria possível manter a atividade do NERPOR ou deste Conselho Empresarial. Provisoriamente a sede que foi indicada foi essa parte onde estão localizados os escritórios do NERPOR mas que, evidentemente, como acontece com todas as empresas ou associações, podem facilmente alterar a localização dessa sede com toda a facilidade. Neste momento pareceu ser a solução natural por esta entidade estar de alguma forma ligada ao NERPOR, mas que se pretende seja, e é, uma entidade diferente, e que será aquilo que as empresas, as pessoas e as instituições que a quiserem integrar, decidam ser no futuro.
Pretende continuar a desempenhar funções de relevância no novo Conselho Empresarial do Alto Alentejo?
Se as pessoas que para lá forem entenderem que eu posso ter alguma utilidade e ajudar com a minha experiência, estou perfeitamente disponível para isso. Não para ter funções executivas, porque não tenho tempo, e já há uns anos que estava a procurar encontrar forma de me libertar destas funções para dar melhor resposta a outras atividades que tenho também a nível internacional, mas sinto que tenho toda esta ligação emocional e no que for possível, entendo que posso dar o meu contributo.

