Ex-vereador do CDS em Elvas, demitiu-se do cargo que ocupava na capital após ser confrontado com o teor das mensagens enviadas pelo seu perfil de Instagram. A Polícia Judiciária enviou proposta de acusação que está nas mãos do Ministério Público.

Tiago Telo de Abreu, assessor do vice-presidente da Câmara Municipal de Lisboa, está a ser investigado pelas autoridades pelo crime de posse e partilha de pornografia infantil. Ao que o Exclusivo da TVI (do mesmo grupo da CNN Portugal) conseguiu apurar, a Polícia Judiciária concluiu o relatório final em dezembro, tendo proposto uma acusação que está há quase três meses nas mãos do Ministério Público do Seixal. Tiago Abreu, que também foi candidato do CDS à Câmara de Elvas várias vezes, demitiu-se após ser confrontado com a investigação.

No cerne de todo este caso está uma mulher de Ponte de Sôr. “Ana”, chamemos-lhe assim. No verão de 2023, enquanto navegava numa aplicação de encontros, deparou-se com uma mulher com o perfil “Dália”. “Conheci a Dália no Badoo”, refere, acrescentando que ela “meteu conversa” consigo e que “Ana” respondeu para ver “se era uma amizade ou alguma coisa”. “Ela [Dália], a primeira vez que me falou a idade, disse que a menina [a sua filha] tinha 12 anos e que dava-lhe banho. E eu disse que sim, que para mim não via mal nenhum em dar banho, porque era filha, mas vi que havia qualquer coisa estranha logo aí na conversa”.

Esse mau pressentimento levou-a a insistir na conversa. No mesmo dia, nota o tom da troca das mensagens a intensificar-se. “Ela começou por dizer que também deu a descobrir o corpo dela, da sua filha e que lavava as partes íntimas e masturbava a criança”. Dália também contou a “Ana” que “fazia sexo oral à menina” e “que a menina também lhe fazia a ela”. “Eu acho que a intenção dela era que eu me juntasse a elas, mas ela queria ver se eu era também de confiança e se realmente também gostava de fazer essas coisas. E eu tentei ao máximo fazer a conversa ao jeito para ela confiar em mim”, refere.

Ao longo de alguns dias, “Ana” começou a sentir que estava cada vez mais a ganhar a confiança de Dália. As mensagens foram evoluindo e, em várias alturas, “Ana” trocou mensagens, através do mesmo perfil, com quem julgou ser a filha de Dália. Nas conversas obtidas pela TVI é possível observar como a criança era apresentada como um instrumento de abusos sexuais com adultos a troco de um preço fixo: 1.500 euros.

Nas mensagens que entendia estar a trocar com a filha de Dália, “Ana” percebeu que a mãe a “levava ao cinema com as amigas dela, sem roupa interior, para as amigas lhe mexerem na vagina”, diz. As conversas continuaram sempre com um tom explícito relativamente à filha do perfil que havia conhecido há poucos dias.

Quinze dias depois, “Ana” é contactada por um outro perfil, que identificou como sendo o de Tiago Abreu, de 50 anos, alguém que desconhecia até então. Ao longo das conversas, Tiago apresenta-se como funcionário da Câmara Municipal de Lisboa e refere que tinha dois amigos em comum com “Ana”: um homem da região de Elvas e Dália. Pouco tempo passou até Tiago começar a relatar os abusos sexuais que praticava com a alegada filha de Dália, com a conivência da própria.

“Ana” recorda que Tiago lhe disse que Dália “mandou a menina fazer sexo oral nele”. “E a menina não queria”. “E ela obrigou, deu-lhe um chapadão”. “E obrigou-a a fazer o sexo oral”. “E pediu para ele dar também uma chapada à menina”. “E ele confessou que deu também”. “E gostou da sensação de bater na menina”. “Depois foram para o quarto”. “E ataram as mãos e os pés da menina”. “E pôs-lhe um pano na boca para fazer sexo”.

Todas estas mensagens surgiram da conta de instagram @tabreu1974. Conta essa que o agora ex-assessor da Câmara Municipal admite ter sido sua, tal como admite a ter apagado. No entanto, garante que as mensagens não foram escritas pelo próprio.

Chocada, “Ana” apresentou queixa à GNR de Ponte de Sor. Segundo garantiu fonte daquela esquadra, a denúncia foi encaminhada, em junho de 2023, para a autoridade competente. Naquele caso, a Polícia Judiciária de Setúbal. A investigação que se sucedeu àquele caso permitiu percepcionar indícios que a mulher de Ponte de Sor nunca suspeitou.

Após analisar aquelas conversas, as autoridades avançaram com buscas à casa de Tiago Abreu no dia 13 de maio.

Segundo o mandado judicial obtido pela TVI, as primeiras suspeitas davam conta de que o perfil do dirigente centrista mantinha “conversação com a utilizadora com o perfil Dália onde surgem diálogos alegadamente envolvendo práticas sexuais com a filha desta”

“No decurso das investigações onde se procuram apurar factos que, por ora, indiciam a prática de crime de abuso sexual de crianças”. “Constatou-se que em julho de 2023 uma pessoa do sexo masculino com o perfil cibernético @tabreu1974 encetou conversação com uma utilizadora Dália onde surgem diálogos alegadamente envolvendo práticas sexuais com a filha desta”, aponta o mesmo documento.

A busca ocorreu às 07:00 horas do dia 13 de maio de 2024. A Polícia Judiciária apreendeu o telemóvel de Tiago Abreu e teve acesso a todas as suas plataformas eletrónicas. Foi levado para a sede da Polícia Judiciária de Setúbal e confrontado com várias fotografias de menores que haviam sido encontradas pelas autoridades.

Estavam duas hipóteses em cima da mesa: ou o antigo assessor da Câmara de Lisboa escrevia o que fantasiava fazer com a filha de Dália ou abusava da menor, tal como descrevia nas mensagens trocadas com “Ana” e remetidas à Judiciária.

“Eles abriram um dossiê em que me mostraram fotografias minhas a dormir. Nua”


No dia das buscas, foi intercetada outra menor de quem Tiago Abreu também falava nas conversas e de quem partilhou imagens íntimas com “Ana”. Nas imagens, a que a TVI teve acesso, a adolescente aparece sempre a dormir e parcialmente despida. Há fotografias da menor a ser alegadamente tocada nas zonas íntimas por Tiago, que também pousou ao lado daquela adolescente.

À TVI, a menor relata o momento em que, na Polícia Judiciária de Setúbal, se deparou com as fotografias. “Estive a falar com eles e eles abriram um dossiê em que me mostraram fotografias minhas a dormir. Nua. E fotografias minhas nua, com ele a sorrir e com a mão em mim”.

A menor diz ter ficado em “choque” quando foi confrontada com aquelas imagens. “A ficha não caiu”. “Aliás, quando ele abriu o dossiê e mostrou a fotografia de uma rapariga numa cama, a primeira coisa que disse foi…não sei quem é”. O inspetor perguntou-lhe se ela tinha a certeza e pediu-lhe que olhasse melhor. Só depois desse exercício é que percebeu que era ela, recorda-se. “Ah, sou eu”.

O caso ganhou outras proporções e, à raiva daquela menor, juntaram-se as preocupações da segunda mulher de Tiago Abreu e mãe de uma das filhas do centrista. “Sofia”, chamemos-lhe assim, já tinha perdido um processo de violência doméstica contra o ex-marido um ano antes.

“Sofia” apresentou uma queixa-crime contra Tiago Abreu por alegado abuso sexual da filha de seis anos e associou-a a este inquérito. “Espero que se faça justiça”, disse à TVI.

“Sofia” e Tiago Abreu mantêm-se até aos dias de hoje numa disputa judicial com vários processos um contra o outro sobre a filha em comum, sendo que na sequência das buscas da Polícia Judiciária à casa de Tiago Abreu, a última mulher do assessor da Câmara de Lisboa deixou de permitir contactos entre pai e filha.

Em resposta à TVI, o antigo dirigente centrista acusa a ex-mulher de subtração de menor e de ser a grande responsável pelo julgamento mediático a que está a ser submetido. “O processo está em segredo de justiça, mas na minha cidade natal, Elvas, no passado ano foram recebidas cartas anónimas, dirigidas aos presidentes das juntas e ao presidente da Câmara e restante vereação, com cópia de parte dos autos, nas quais eu era difamado”, disse por escrito.

Tiago Abreu: “Não possuo nem uma fotografia que possa sugerir pornografia infantil”
“Como se não bastasse, remeteu igual conteúdo para a Câmara Municipal de Lisboa, o meu local de trabalho, e para todos os vizinhos do prédio em que habito. E mais, posso também dizer-lhe que o colégio que a minha filha mais nova frequenta também recebeu elementos do processo. Por isso não raras vezes digo que isto não devia ser um processo crime, mas sim um processo de alienação parental de uma mãe em relação a um pai”. “É inimaginável a dimensão da dor, da indignação e do dano que isto me causa, não tendo eu dúvidas de que este processo acabará sem que nada me seja imputado”, aponta.

Tiago Abreu, que foi constituído arguido neste processo, sublinha que está a viver um pesadelo do qual não se consegue defender e a única explicação que encontra para as mensagens trocadas, e que estão na base desta investigação, é a possibilidade de alguém ter acedido indevidamente à sua conta.

Admite ainda ter iniciado conversas através da sua conta de Instagram com “Ana”, de Ponte de Sôr. Refere também que, quando foi ouvido pelo Ministério Público do Seixal, a procuradora encarregue do caso questionou-o sobre a razão de uma conta de Dália estar associada ao seu e-mail. “Se alguém possuir o acesso à minha conta Google, possui o acesso a todo um conjunto de dados: ao email, aplicações, google fotos, etc, etc”, afirma em resposta à TVI.

No entanto, ao que a TVI apurou, a Polícia Judiciária não retirou as mesmas ilações e propôs ao Ministério Público que o acuse pela posse e partilha de pornografia infantil. Isto depois de ter concluído que Tiago será o autor das duas contas de Instagram apagadas – a dele e a de Dália – imediatamente após as buscas das autoridades.

A Polícia Judiciária admite que o assessor do CDS se terá feito passar por uma alegada Dália, que inventou, tendo para tal recorrido às imagens que uma outra mulher tinha publicado no Facebook. A TVI conseguiu localizar a mãe de uma das menores das quais Tiago Abreu partilhou fotografias. Mora em Elvas, a mesma cidade onde Tiago Abreu se tornou dirigente do CDS, garantiu estar em choque, não ter qualquer conhecimento sobre o assunto e avançou que irá apresentar uma queixa-crime contra Tiago Abreu por devassa da vida privada.

Tiago Abreu, contudo, desmente tudo. “Seria insano no mínimo da minha parte, criar um perfil para que mantivesse, entre outras, conversas com o meu próprio perfil, sobre sexo ou qualquer outro tema, não crê?” Já sobre as suspeitas de pornografia infantil, responde que possui “muitas fotografias das minhas filhas”. “Não possuo nem uma que possa sugerir pornografia infantil”.

Ao que a TVI conseguiu apurar, o relatório final da Polícia Judiciária foi concluído em dezembro. Desde esse mês que está ao cargo do Ministério Público do Seixal, nas mãos da procuradora Ana Dimas. Contactada, a magistrada nada nos quis revelar.

Fonte: Texto integral publicado na TVI CNN – Sandra Felgueiras, Luís Vigário, Henrique Magalhães Claudino / TVI CNN Portugal

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